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Revista Portuguesa de Estomatologia, Medicina Dentária e Cirurgia Maxilofacial
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Inicio Revista Portuguesa de Estomatologia, Medicina Dentária e Cirurgia Maxilofacial Prevalência de complicações associadas à colocação de piercings orais
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Vol. 55. Issue 4.
Pages 243-249 (October - December 2014)
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Vol. 55. Issue 4.
Pages 243-249 (October - December 2014)
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Prevalência de complicações associadas à colocação de piercings orais
Prevalence of complications associated with oral piercing placement
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Andreia Simõesa, Maria Conceição Mansob,
Corresponding author
cmanso@ufp.edu.pt

Autor para correspondência.
, Ricardo Faria de Almeidac, Mónica Morado Pinhoa
a Departamento de Ciências Médicas, Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade Fernando Pessoa‐FCS, Porto, Portugal
b Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade Fernando Pessoa, CIAGEB, Porto, Portugal, & REQUIMTE, Universidade do Porto, Porto, Portugal
c Faculdade de Medicina Dentária, Universidade do Porto, Portugal, Portugal
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Tables (6)
Tabela 1. Análise descritiva das respostas obtidas no inquérito aos pacientes, por piercing (n=109)
Tabela 2. Distribuição das alterações sentidas ao nível da cavidade oral por localização do piercing (n=71)
Tabela 3. Exame clínico do piercing e zonas envolventes (n=109)
Tabela 4. Distribuição de complicações e/ou alterações por localização do piercing (n=109)
Tabela 5. Distribuição da quantidade de recessão gengival por dente (n=74)
Tabela 6. Comparação de prevalências do presente estudo com valores publicados
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Resumo
Objetivos

Determinar a prevalência de complicações/alterações associadas à colocação de piercings orais; Conhecer a prevalência das localizações dos piercings; Comparar a perceção do utilizador do piercing e a do investigador, relativamente a alterações gengivais.

Métodos

Estudo observacional, transversal; Amostra de conveniência: 109 piercings observados em 82 indivíduos com idades compreendidas entre os 14 e os 30 anos pertencentes à Escola Artística de Soares dos Reis no ano letivo 2012/2013 e indivíduos de quem os autores tinham conhecimento de possuírem piercings orais. Os participantes preencheram um questionário e foram submetidos a um exame clínico por um examinador. Dados analisados recorrendo aos testes Qui‐quadrado, Fisher e teste‐t (α=0,05).

Resultados

Na amostra (76,8% género feminino), a idade média é de 20,2 (±4,1) anos, sem diferença significativa por género (teste‐t, p<0,05). Observou‐se 109 piercings orais em 82 indivíduos e determinou‐se uma prevalência de complicações e/ou alterações de 63,3% (IC95%: 54,3%‐72,3%). A recessão gengival estava presente em 39,4% dos piercings, fraturas dentárias observou‐se em 11,9%, depressão labial 9,2%, depressão na mucosa 3,6%, inflamação 2,8%, edema do freio labial 1,8%, quelóide 1,8%, depressão na língua 0,9%, edema da língua 0,9%, hiperplasia no lábio 0,9%, lesão no palato 0,9%, mobilidade dentária 0,9% e laceração 0,9%.

Conclusões

Dentro das limitações do nosso estudo podemos concluir que 63,3% dos piercings observados apresentava algum tipo de complicação e/ou alteração associada.O piercing mais prevalente estava colocado no lábio. Deteta‐se uma associação entre a observação de recessão gengival (investigador) e a não sensação de alteração ao nível da gengiva (participante).

Palavras‐chave:
Piercing labial
Piercing lingual
Gengiva
Recessão gengival
Fractura dentária
Abstract
Objectives

To determine the prevalence of complications/changes associated with the placement of oral piercings; Get to know the locations of the prevalence of oral piercings; Compare the perceptions of the user and the investigator regarding gingival changes.

Methods

Observational and cross‐sectional study. Convenience sample: 109 piercings seen in 82 individuals aged between 14 and 30, studying in Escola Artística Soares dos Reis during the academic year 2012/2013, and also individuals who have oral piercings known by the authors. Participants filled a questionnaire and were submitted to an oral examination. Data was analysed using Chi‐square, Fisher and t‐test (α=0.05).

Results

The sample (76.8% females) average age (±SD) is 20.2 (±4.1) years, with no significant difference by gender (t‐test, p<0.05). We observed 109 oral piercings in 82 individuals and determined the prevalence of complications and/or changes associated with placement of oral piercings 63.3% (95%CI:54.3%‐72.3%). The gingival recession was present in 39.4% of the observed piercings, dental fractures were observed in 11.9%, 9.2% lip depression, mucosa depression 3.6%, inflammation 2.8%, edema of the labial frenulum 1.8%, keloid 1.8%, 0.9% tongue depression, tongue edema 0.9%, 0.9% hyperplasia on the lip, palate injury in 0.9%, 0.9% tooth mobility and 0.9% laceration.

Conclusion

Within the limitations of our study we can conclude that 63.3% of the observed piercings have complication/changes associated. The most common piercing procedure is the lip piercing. There is an association between the observation of gingival recession (researcher) and the lack of feeling of change at the level of the gingiva (subject).

Keywords:
Lip piercing
Tongue piercing
Gingival
Gingival recession
Tooth injuries
Full Text
Introdução

Os piercings são das formas mais antigas de ornamentação e modificação corporal1–4. A decoração, através da sua colocação, tem vindo a aumentar nos últimos anos e é praticada por diversos grupos sociais e etários5. Contudo, a crescente utilização ocorre sobretudo por parte de adolescentes e jovens adultos com idades compreendidas entre os 13 e os 30 anos6.

O piercing corporal é definido como a penetração do adorno em orifícios feitos na pele e/ou mucosa4,7–9 recorrendo a um instrumento afiado que cria uma abertura, em torno da qual, é possível aplicar o ornamento7.

Diversos locais da cavidade oral são alvo de perfurações. Segundo a literatura, os piercings na região oral podem ser colocados na língua, lábios, bochechas, freio labial, freio lingual, úvula ou quaisquer combinações dos locais mencionados.

Dependendo da localização da perfuração e do gosto pessoal de cada indivíduo, os ornamentos podem ser confecionados em diversos materiais e possuir diversas formas10, podendo‐se apresentar em titânio G23 coloridos ou cor metálica, aço cirúrgico, politetrafluoretileno (PTFE): «Teflon» (utilizado na barras dos piercings), silicone cirúrgico e acrílico (utilizado nas esferas dos piercings). Quanto às formas, estes podem ser do tipo labret, barbell, circular barbell, bananabell, ball closer ring, segment ring ou twist.

Os piercings orais tornaram‐se a forma mais prevalente de arte corporal7, apresentando, nos dias de hoje, uma prevalência que varia entre 3,4% e 20,3%11,12.

Contudo, este tipo de ornamento pode provocar alterações na cavidade oral e comprometer a saúde do seu utilizador13. As complicações podem ser categorizadas em precoces (agudas) ou tardias (crónicas). As precoces incluem a dor, edema, hemorragia prolongada, infeção bacteriana, dificuldades na mastigação, deglutição e fonação. As tardias envolvem fraturas dentárias, infeções recorrentes, trauma gengival, perda de inserção localizada, dificuldades persistentes nas funções orais ou até a deglutição do próprio objeto5.

O objetivo primário deste trabalho é determinar a prevalência de complicações e/ou alterações orais inerentes à colocação de piercings na cavidade oral numa população com idades compreendidas entre os 13 e os 30 anos, conhecer a prevalência das localizações dos piercings orais, bem como, comparar a perceção do utilizador do piercing com a do investigador, relativamente a alterações gengivais. Como objetivo secundário, este trabalho pretende esclarecer a comunidade científica no que concerne a alterações possíveis, ao nível dos tecidos duros e moles da cavidade oral, na decorrência da colocação de piercings orais.

Materiais e métodos

Foi realizado um estudo observacional, transversal, com uma amostra não probabilística de indivíduos que pertenciam à Escola Artística de Soares dos Reis no ano letivo 2012/2013 e ainda indivíduos que o autor tinha conhecimento de possuírem piercings orais, com idade entre os 14 e os 30 anos.

O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética da Faculdade de Ciência da Saúde da Universidade Fernando Pessoa. Todos os participantes receberam informação, oral e escrita, respeitante aos objetivos e métodos do estudo e assinaram um consentimento informado. Todos os participantes tinham de possuir piercing oral ou perioral. Foram excluídos os que apresentassem patologia sistémica ou tomassem algum medicamento com impacto na cavidade oral.

Os dados foram recolhidos por entrevista presencial realizada pelo investigador com base num questionário aplicado e adaptado por Boardman& Smith14 e foi também realizada uma observação clínica visual da região oral e perioral de cada indivíduo, com recurso a um espelho plano n°5 com cabo n°25 e sonda periodontal CP12. O exame clínico incluiu, além da determinação da localização do piercing, a observação pormenorizada das estruturas adjacentes ao local perfurado: fratura dentária, recessão gengival, inflamação, mobilidade dentária, nódulo, laceração e outras alterações, como depressão labial, depressão lingual, depressão na mucosa, edema do freio labial, edema da língua, hiperplasia no lábio, lesão no palato e quelóide. Foi colocada uma questão sobre se sentiu dor na colocação do piercing, e a resposta positiva foi avaliada numa escala de 0 (ausência de dor) a 5 (dor máxima)15.

A análise estatística dos dados obtidos foi efetuada com recurso ao IBM© SPSS© Statistics vs.21 (α=0,05). As variáveis qualitativas foram descritas como contagens e proporções e a associação entre categorias de diferentes variáveis qualitativas foi testada através dos testes de qui‐quadrado ou de Fisher. Para além disso a comparação de contagens/proporções observadas no presente estudo com resultados reportados por outros autores foi realizada recorrendo a testes de qui‐quadrado. A idade foi descrita através da média e respetivo desvio padrão e comparada por género utilizando o teste t‐Student (normalidade presente). A análise de variáveis género, idade, frequência hábitos tabágicos e de substâncias ilícitas foi realizada por indivíduo e posteriormente por piercing, para responder aos objetivos do estudo.

Resultados

Foram avaliados 82 indivíduos com idades compreendidas entre os 14 e os 30 anos (20,2±4,1 anos), maioritariamente do género feminino (76,8%), não se tendo verificado diferenças significativas (p=0,227) na idade média dos participantes por género.

Relativamente a hábitos tabágicos, 82,9% dos indivíduos afirmaram ser fumadores, a maioria (45,1%) fumava menos de 10 cigarros por dia, 32,9% fumava entre 10 a 20 cigarros por dia e 4,9% fumava mais de 20 cigarros por dia. A maioria dos participantes declararam ser consumidores de drogas (59,8%), destes, 14,6% consume drogas diariamente, 34,1% semanalmente, 4,9% mensalmente e 6,1% esporadicamente.

Nesta amostra, 70,7% dos indivíduos apresentava apenas 1 piercing, 25,6% possuía 2 piercings e 3,7% continha 3 piercings na cavidade oral, perfazendo um total de 109 piercings observados.

Dos 109 piercings avaliados (tabela 1), o piercing mais frequente foi o labial (50,4%), seguido do piercing lingual (25,7%), do piercing no freio labial (16,5%), e dos piercings no freio lingual e na bochecha em 4,6% e 2,8%, respetivamente.

Tabela 1.

Análise descritiva das respostas obtidas no inquérito aos pacientes, por piercing (n=109)

 
Localização do piercing
Lábio  55  50,4 
Língua  28  25,7 
Freio lingual  4,6 
Freio labial  18  16,5 
Bochecha  2,8 
Tempo de uso
<6 meses  27  24,8 
6‐12 meses  15  13,8 
>12 meses‐24 meses  13  11,9 
≥24 meses  54  49,5 
Razão da colocação
Moda  2,8 
Influência de amigos  2,8 
Expressão de identidade  24  22 
Beleza/Questões estéticas  49  45 
Identificação com grupo  0,9 
Rebeldia  7,3 
Outra  21  19,3 
Sente diferença na viscosidade saliva?
Não  96  88,1 
Sim  13  11,9 
Tem sensibilidade alterada?
Não  93  85,3 
Sim  16  14,7 
Alterações sentidas ao nível da cavidade oral (n=71)
Deglutição  6,4 
Fala  24  22 
Paladar  0,9 
Dificuldade em higienizar  5,5 
Fractura Dentária  11  10,1 
Alteração na gengiva  16  14,7 
Dor persistente  1,8 
Inflamação persistente 
Outra  3,7 
Foi anestesiado?
Não  54  49,5 
Sim  55  50,5 
Sentiu dor na colocação do piercing?
Não  62  56,9 
Sim  47  43,1 
Dor na colocação do piercing (n=47)
1 (Dor mínima)  14,9 
17  36,2 
13  27,7 
17,0 
5 (Dor máxima)  4,3 
Utilizou analgésico no pós‐operatório?
Não  100  91,7 
Sim  8,3 
Material utilizado
Nenhum material esterilizado ou descartável  3,7 
Agulhas descartáveis+Materiais Esterilizados  1,8 
Tudo (Luvas e agulhas descartáveis e Materiais Esterilizados)  103  94,5 
Recebeu orientações de higiene local do piercing?
Não  12  11 
Sim  97  89 
Higieniza piercing individualmente?
Não  39  35,8 
Sim  70  64,2 
Sim, não o removendo  17  15,6 
Sim, removendo‐o  53  48,6 
Recorreu a algum dentista após fazer o piercing?
Não  55  50,5 
Sim  54  49,5 
Voltava a fazer o piercing?
Não  4,6 
Sim  104  95,4 

A análise da relação entre localização de piercings por sexo mostra existir uma associação significativa (p=0,012), em que a localização no lábio é mais frequente em homens (65,4%‐homens/45,8%‐mulheres), enquanto as mulheres usam significativamente mais piercings no freio labial (17,5%‐mulheres/3,8%‐homens) e lingual (10,2%‐mulheres/1,9%‐homens). As restantes localizações apresentam uma distribuição semelhante (língua: 25,3%‐mulheres/26,9%‐homens; bochecha: 1,2%‐mulheres/1,9%‐homens).

Relativamente ao local de colocação por faixa etária, detetou‐se uma diferença significativa (p=0,010), com o piercing labial mais observado em pessoas com idades maiores ou iguais a 26 anos (63,2%) e menores que 21 anos (52,4%), enquanto o piercing lingual se verificava mais nos indivíduos com idades compreendidas entre os 21 e 25 anos inclusive (44,4%). Os piercings no freio labial e no freio lingual foram mais frequentes em indivíduos com menos de 21 anos (18,3% e 10,3%, respetivamente).

A maior parte das perfurações foram realizadas há mais de 24 meses (49,5%), e cerca de um quarto (24,8%) há menos de 6 meses (tabela 1).

As razões mais apontadas para a colocação do piercing (tabela 1) foram as questões estéticas (45%), seguida de expressão de identidade (22%) e de rebeldia (7,3%). A identificação com o grupo, a influência de amigos e por ser moda soma 5,5%.

Os participantes referiram ter sentido alguma diferença na cavidade oral associada à colocação piercings (45 piercings), perfazendo, contudo, um total de 71 alterações sentidas, com 22% das queixas relacionadas com a fala.

Na colocação dos piercings, 50,5% foram colocados sob anestesia, a dor foi sentida em 43,1% das perfurações, e em que metade dessas perfurações o grau de dor foi 2 ou inferior (menor grau de dor), e em apenas 8,3% se utilizou analgésico no pós‐operatório (tabela 1). Relativamente a uma possível associação entre anestesia e dor, não se verificou associação significativa (p=0,782), ou seja, a anestesia não teve o efeito para o qual é indicada, ou não foi eficaz.

Das alterações mencionadas 9,9% referiam‐se a alteração na deglutição, a fala 33,8%, o paladar 1,4%, dificuldade em higienizar 8,5%, fratura dentária 15,5%, alteração na gengiva 22,5%, dor persistente 5,6% e outras alterações 5,6% dos piercings (tabela 2).

Tabela 2.

Distribuição das alterações sentidas ao nível da cavidade oral por localização do piercing (n=71)

Alteração ao nível da cavidade oral  Localização do PiercingTotal 
  Lábio  Língua  Freio lingual  Freio labial   
Deglutição 
Fala  15  24 
Paladar 
Dificuldade em higienizar 
Fratura dentária  11 
Alteração na gengiva  16 
Dor Persistente 
Outra 

Durante o exame clínico (tabela 3) observou‐se a existência de placa bacteriana e/ou tártaro no ornamento em 24,8% dos piercings observados e que 63,3% dos piercings avaliados possuía algum tipo de complicação/alteração no local da perfuração ou nas suas proximidades. A fratura dentária, consequência da utilização do ornamento, ocorreu em 11,9% dos piercings, a mobilidade dentária verificou‐se em 0,9%, recessão gengival em 39,4%, inflamação em 2,8%, laceração em 0,9%, nódulo não foi associado a nenhum piercing e outras complicações/alterações verificaram‐se em 20,2%.

Tabela 3.

Exame clínico do piercing e zonas envolventes (n=109)

Exame clínico 
O piercing tem placa
Não  82  75,2 
Sim  27  24,8 
Complicações orais
Não  40  36,7 
Sim  69  63,3 
Fratura Dentária
Não  96  88,1 
Sim  13  11,9 
Mobilidade Dentária
Não  108  99,1 
Sim  0,9 
Recessão Gengival
Não  66  60,6 
Sim  43  39,4 
Inflamação
Não  106  97,2 
Sim  2,8 
Nódulo
Não  109  100 
Laceração
Não  108  99,1 
Sim  0,9 
Outras complicações orais
Depressão labial  10  9,2 
Depressão na língua  0,9 
Depressão na mucosa  3,6 
Edema freio labial  1,8 
Edema língua  0,9 
Hiperplasia no lábio  0,9 
Lesão no palato  0,9 
Quelóide  1,8 

De 109 piercings observados, apenas 40 não apresentaram complicações e/ou alterações associadas, sendo que, 52,5% destes corresponderam a piercings localizados no lábio, 10% a piercings linguais, 12,5% a piercings no freio lingual e 25% a piercings do freio labial (tabela 4).

Tabela 4.

Distribuição de complicações e/ou alterações por localização do piercing (n=109)

Alterações e/ou Complicações  Localização do PiercingTotal n=109 
  Lábio n=55  Língua n=28  Freio lingual n=Freio labial n=18  Bochecha n= 
Sem complicações orais  21 (52,5%)  4 (10%)  5 (12,5%)  10 (25%)  0 (0%)  40 (36,7%) 
Fratura Dentária  4 (30,8%)  9 (69,2%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  13 (11,9%) 
Recessão Gengival  23 (53,5%)  17 (39,5%)  0 (0%)  3 (7%)  0 (0%)  43 (39,4%) 
Inflamação  1 (33,3%)  1 (33,3%)  0 (0%)  0 (0%)  1 (33,3%)  3 (2,8%) 
Mobilidade Dentária  0 (0%)  1 (100%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  1 (0,9%) 
Nódulo  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%) 
Outras complicações  12 (54,5%)  3 (13,6%)  0 (0%)  6 (27,3%)  1 (4,5%)  22 (20,2%) 
Depressão Labial  10 (100%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  10 (9,2%) 
Depressão na Língua  0 (0%)  1 (100%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  1 (0,9%) 
Depressão na Mucosa  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  4 (100%)  0 (0%)  4 (3,7%) 
Edema Freio Labial  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  2 (100%)  0 (0%)  2 (1,8%) 
Edema Língua  0 (0%)  1 (100%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  1 (0,9%) 
Hiperplasia no Lábio  1 (100%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  1 (0,9%) 
Lesão no Palato  0 (0%)  1 (100%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  1 (0,9%) 
Quelóide  1 (50%)  0 (0%)  0 (0%)  0 (0%)  1 (50%)  2 (1,8%) 

Outras complicações e/ou alterações acometeram 22 piercings. 54,5% destes corresponderam a piercings labiais, 27,3% a piercings no freio labial, 13,6% a piercings linguais e 4,5% a piercings localizados na bochecha.

Na presença de fratura, não existiu associação entre a localização dos dentes (anterior versus posterior) e se a fratura envolve esmalte ou dentina (p=0,294).

Ocorreram duas fraturas de esmalte ao nível do dente 16, uma no dente 12, três no dente 11, duas no dente 21, uma no dente 25, uma no dente 27, três no dente 31 e três no dente 41 (todas classe 1 de Garcia‐Godoy16). Apenas se observou uma fratura com envolvimento da dentina, no dente 46 (classe 2 de Garcia‐Godoy16).

Constatou‐se uma associação significativa (observação clínica pelo investigador, não é percebida pelos participantes) entre a observação clínica de recessão gengival (investigador) e falta de sensação de alteração ao nível da gengiva pelo participante (p=0,009). A maior parte dos participantes com recessão gengival, observada pelo investigador, (74,4%) não referiu ter sentido essa alteração, pelo contrário, quando não é observada recessão gengival (investigador), 7,6% referiu ter sentido alteração.

Globalmente, 74 dentes apresentam recessão gengival. Contudo, a maioria (59 dentes) possui profundidades de recessão gengival entre 1 e 2mm (tabela 5). 33 dentes (5° sextante) manifestam algum tipo de recessão gengival a nível lingual. Destes, 24 apresentam deslocamento apical da margem gengival entre 1 e 2mm, sete com 3mm e dois iguais ou superior a 4mm. Trinta e sete dentes, também pertencentes ao 5° sextante, mas neste caso em vestibular, apresentaram recessão gengival. A recessão gengival variou maioritariamente entre 1 e 2mm (31 dentes), três apresentaram 3mm de recessão e noutros três registaram‐se valores iguais ou superiores a 4mm. Os dentes 31 e 41 foram os mais afetados por recessão gengival, independentemente da extensão da mesma (tabela 5).

Tabela 5.

Distribuição da quantidade de recessão gengival por dente (n=74)

  Profundidades de Recessão Gengival
  1‐2 mm  3 mm  ≥4 mm 
Dente
11 
21 
23 
32 
31  24 
41  23 
42 
43 

Com o aumento no tempo de utilização do piercing, aumenta a frequência de fraturas dentárias e recessão gengival. Neste caso, a presença destas complicações é maior nos indivíduos que colocaram o piercing há mais de 24 meses comparando com os que possuem o piercing há 24 meses ou menos (p=0,043).

A tabela 6 apresenta a comparação de prevalências de complicações e/ou alterações, de recessão gengival, e de fraturas dentárias com as publicadas por outros autores.

Tabela 6.

Comparação de prevalências do presente estudo com valores publicados

Referência  Prevalência referida  Comparação com o presente estudo, valor p* 
Complicações e/ou Alterações Prevalência=63,3%
Hickey, B. et al. (2010)17  23,4%  <0,001 
López‐Jornet, P. & Camacho‐Alonso, F. (2006)18  33,6%  <0,001 
Firoozmand, L., Paschotto, D. & Almeida, J. (2009)19  74,3%  0,009 
Recessão Gengival Prevalência=39,4%
Campbell, A. et al. (2002)1  19,2%  <0,001 
Kapferer, I. et al. (2007)5  68,0%  <0,001 
Vieira, E. et al. (2011)8  4,8%  <0,001 
Vilchez‐Perez, M. et al. (2009)10  22,0%  <0,001 
Levin, L., Zadik, Y. & Becker, T. (2005)12  26,6%  0,002 
Saquet, P. et al. (2009)13  3,9%  <0,001 
Hickey, B. et al. (2010)17  8,6%  <0,001 
López‐Jornet, P. & Camacho‐Alonso, F. (2006)18  23,5%  <0,001 
Inchingolo, F. et al. (2011)20  25,0%  <0,001 
Leichter, J. & Monteith, B. (2006)21  68,13%  <0,001 
Fraturas Dentárias Prevalência=11,9%
Campbell, A. et al. (2002)1  19,2%  0,054 
Vieira, E. et al. (2011)8  2,4%  <0,001 
Levin, L., Zadik, Y. & Becker, T. (2005)12  13,9%  0,551 
Saquet, P. et al. (2009)13  1,9%  <0,001 
Hickey, B. et al. (2010)17  7,0%  0,044 
López‐Jornet, P. & Camacho‐Alonso, F. (2006)18  13,3%  0,673 
Firoozmand, L., Paschotto, D. & Almeida, J. (2009)19  5,1%  0,001 
Inchingolo, F. et al. (2011)20  30,0%  <0,001 
Pires, I. et al. (2010)22  26,7%  0,035 
Stead, L. et al. (2006)23  31,0%  <0,001 
Oberholzer, T. & George, R. (2010)24  19,0%  <0,001 
*

Teste de qui‐quadrado.

Discussão

A prevalência de complicações e/ou alterações presenciadas neste estudo é de 63,3% difere significativamente do apresentado por outros autores (tabela 6), sendo nuns casos significativamente superior17,18 e, noutros, significativamente inferior19.

Neste estudo, a percentagem de recessão gengival observada é de 39,4%, o que, comparativamente com o apresentado na bibliografia (tabela 6), é significativamente maior que a observada por vários autores1,8,10,12,13,17,18,20, e também significativamente menor que a observada por outros5,21.

A maior parte da recessão observada neste estudo envolve piercings labiais, o que está de acordo com a bibliografia17. Segundo a literatura1,12 os incisivos centrais inferiores são os dentes mais afetados por recessão gengival, o que não é diferente do observado neste estudo. Neste estudo, o incisivo central inferior direito (41) apresentou‐se como o dente mais acometido por recessão gengival, pelo contrário, outro estudo1 observou o incisivo central inferior esquerdo (31).

A prevalência observada de fraturas dentárias foi de 11,9%, valor que não difere significativamente (tabela 6) de alguns observados na literatura1,12,18. Outros estudos8,13,17,19 relatam prevalências observadas são significativamente inferiores, pelo que, os autores observaram menos dentes fraturados comparativamente com este estudo. Por outro lado, outros autores20,22–24 observaram um número significativamente maior de fraturas em comparação com o presente estudo.

Neste estudo, os incisivos centrais mandibulares apresentam um número superior de fraturas quando comparados com outras posições, enquanto outro estudo12 mostra os incisivos centrais maxilares foram os dentes com mais fraturas dentárias.

O presente estudo tem limitações, entre as quais se destaca o tratar‐se de um estudo cuja amostra foi obtida por conveniência, pelo que os resultados poderão não serem indicativos do que acontece na população portadora de piercings, e por se tratar de um estudo transversal, não foi possível aferir se, no caso das recessões gengivais e fraturas dentárias, as mesmas já se encontravam presentes antes da colocação dos ornamentos. No parâmetro fratura dentária as considerações tiveram por base a resposta transmitida ao investigador pelo participante quando questionadas acerca da origem da fratura.

Conclusões

Dentro das limitações impostas pelo tipo de estudo, pode concluir‐se que a prevalência de complicações e/ou alterações inerentes à colocação de piercings orais foi elevada. A recessão gengival foi a complicação mais observada, seguindo‐se a fratura dentária. O piercing mais prevalente foi o piercing localizado no lábio, verificando‐se uma associação significativa entre a observação de recessão gengival (investigador) e a falta de sensação de alteração ao nível da gengiva (participante).

Responsabilidades éticasProteção de pessoas e animais

Os autores declaram que para esta investigação não se realizaram experiências em seres humanos e/ou animais.

Confidencialidade dos dados

Os autores declaram ter seguido os protocolos do seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes.

Direito à privacidade e consentimento escrito

Os autores declaram ter recebido consentimento escrito dos pacientes e/ou sujeitos mencionados no artigo. O autor para correspondência deve estar na posse deste documento.

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

Agradecimentos

A autora M.C. Manso agradece o financiamento de fundos da União Europeia (FEDER, através do COMPETE) e de fundos nacionais (Fundação para a Ciência e Tecnologia) pelo projecto Pest‐C/EQB/LA0006/2013.

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