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Vol. 25. Núm. 1.
Páginas 28-30 (Enero - Junio 2014)
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Vol. 25. Núm. 1.
Páginas 28-30 (Enero - Junio 2014)
Caso clínico
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Deficiência da desidrogenase de 3‐hidroxi‐acil‐coa de cadeia longa no feto e fígado gordo agudo da gravidez
Long‐chain 3‐hidroxyacyl‐coenzyme‐A‐dehydrogenase foetal deficit and acute fatty liver in pregnancy
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Marisa Moreira
Autor para correspondencia
marisamoreira1980@hotmail.com

Autor para correspondência.
, Sofia Franco, Filomena Coelho, Francisco Tavares da Silva, Paulo Moura
Serviço de Obstetrícia, Hospitais da Universidade de Coimbra, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Coimbra, Portugal
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Resumo

As interações materno‐fetais são determinantes para a saúde materna e o desfecho perinatal. Podem ocorrer doenças hepáticas específicas da gravidez, nomeadamente no fígado gordo agudo da gravidez e síndrome hemolysis, elevated liver enzymes and low platelets (HELLP). Apesar de a sua etiopatogenia não estar completamente esclarecida, tem sido associada a anomalias na oxidação dos ácidos gordos pelo feto, particularmente com defeitos da oxidação de ácidos gordos de cadeia longa. Relatamos o caso clínico de uma gestação complicada por fígado gordo agudo da gravidez, na qual foi detetada a mutação 1 528 G>C em homozigotia no recém‐nascido e em heterozigotia em ambos os progenitores. O rastreio de distúrbios da oxidação de ácidos gordos e especificamente de deficiência da desidrogenase de 3‐hidroxi‐acil‐coa de cadeia longa (LCHAD) deve ser feito a recém‐nascidos de mães que apresentem complicações na gravidez, como fígado gordo agudo da gravidez ou síndrome HELLP severo ou recorrente.

Palavras‐chave:
Oxidação de ácidos gordos
Deficiência da desidrogenase de 3‐hidroxi‐acil‐coa de cadeia longa
Gravidez
Fígado gordo agudo
Abstract

Maternal‐foetal interactions are critical determinants of maternal health and perinatal outcome. Liver diseases uniquely related to pregnancy may develop, including acute fatty liver of pregnancy and HELLP (hemolysis, elevated liver enzymes and low platelets) syndrome. Although the etiopathogenesis has not been completely elucidated, these diseases have been associated with foetal fatty oxidation disorders, particularly correlated with foetal defects of long‐chain fatty oxidation. We report a clinical case of a complicated pregnancy with an acute fatty liver of pregnancy and the detection of mutation 1528G>C in the newborn's and both parents’ homozygote. Screening for fatty acid oxidation disorders and specifically long‐chain 3‐hidroxyacyl‐coenzyme‐A‐ dehydrogenase deficiency (LCHAD) should be carried out with newborns from mothers with hepatic complications during pregnancy such as acute fatty liver of pregnancy or severe or recurrent HELLP syndrome.

Keywords:
Fatty acid oxidation
Long‐chain 3‐hidroxyacyl‐coenzyme‐A‐dehydrogenase deficiency
Pregnancy
Acute liver fat
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Introdução

O défice de desidrogenase de 3‐hidroxi‐acil‐coa de cadeia longa (LCHAD), deficiência enzimática da β‐oxidação mitocondrial dos ácidos gordos de cadeia longa, é causado por um defeito genético autossómico recessivo com manifestações clínicas e gravidade variáveis.

Doenças hepáticas específicas da gravidez, como fígado gordo agudo da gravidez (FGAG) e síndrome hemolysis, elevated liver enzymes and low platelets (HELLP), têm sido associadas a anomalias fetais na oxidação dos ácidos gordos de cadeia longa.

Caso clínico

Primigesta, 30 anos, gravidez vigiada e de evolução normal até às 27 semanas. Casal não consanguíneo e saudável.

Internamento às 27 semanas por vómitos e intolerância alimentar. Analiticamente, apresentava marcadores de lise hepatocelular (elevação acentuada das transaminases), discreta colestase (elevação ligeira da fosfatase alcalina e bilirrubinas) e serologias para hepatites víricas negativas. Detetada, também, hipoprotrombinémia e prolongamento do tempo de protrombina. Ecografia fetal revelou estimativa de peso fetal 1 100‐1 600g, líquido amniótico normal, Doppler da artéria umbilical normal, perfil biofísico ‐ 6/8 (ausência de movimentos respiratórios). O registo cardiotocográfico revelou desacelerações variáveis. Iniciou‐se ciclo de corticoterapia para maturação pulmonar fetal.

Perante este quadro clínico foram admitidas como hipóteses de diagnóstico: FGAG, colestase gravídica, síndrome HELLP, hepatite tóxica ou hepatite autoimune.

Por doença materna grave e estado fetal não tranquilizador, decidiu‐se cesariana. O recém‐nascido (RN), com 1 120g e índice de Apgar 4/9/9, foi internado na Unidade de Cuidados Intensivos de Recém‐Nascidos até D36. Durante o internamento, o RN apresentou glicémias e função hepática normais. O diagnóstico precoce ‐ «Teste do Pézinho» – para rastreio de hipotiroidismo e doenças metabólicas foi realizado a D17 e, por suspeita de défice LCHAD ou proteína trifuncional mitocondrial, repetido a D28, tendo o estudo molecular revelado homozigotia para a mutação 1 528G>C, no exão 15 do gene HADHA. Desde o diagnóstico, foram administrados ao RN suplementos de L‐carnitina. Teve alta a D53 orientado para vigilância em consulta externa de doenças metabólicas.

A puérpera apresentou melhoria clínica e analítica. O estudo molecular do casal revelou serem portadores, em heterozigotia, da mesma mutação que a filha.

Numa gestação subsequente foi realizada amniocentese, para diagnóstico molecular pré‐natal de défice LCHAD. O resultado revelou a presença da mutação 1 528G>C no exão 15 em heterozigotia (feto apenas portador). Nesta gravidez, a avaliação hepática pré‐natal foi sempre normal, terminando numa cesariana a termo, com RN saudável.

Discussão

É reconhecido que um largo espectro de doenças hepáticas pode ocorrer na grávida, nomeadamente pré‐eclâmpsia, eclâmpsia, FGAG e síndrome HELLP. Achados clínicos e patológicos sugerem que estas entidades, com presença de esteatose hepática, podem compartilhar uma etiopatogenia comum1,2.

Nas complicações hepáticas maternas da gravidez, a associação mais fortemente reportada é o FGAG e a deficiência fetal de LCHAD3–5.

A via da β‐oxidação mitocondrial dos ácidos gordos é a via primária pela qual se gera energia dos ácidos gordos livres para o cérebro, coração, fígado e músculo esquelético, especialmente durante os períodos de jejum, quando as reservas de glicogénio se esgotam5,6. A LCHAD, uma das 3 enzimas da proteína mitocondrial trifuncional, é codificada pelos exões 11‐20 dentro do gene da α‐subunidade e a mutação mais prevalente, 1 528G>C, herdada de forma autossómica recessiva, ocorre no exão 15 e resulta na substituição da glutamina por glutamato na posição 474 (Glu474Gln) no local de catalização2,7.

A maioria das séries estima que o FGAG ocorre em aproximadamente 1/10 000 a 1/15 000 gestações e tem uma taxa de mortalidade materna de 10‐20% e uma mortalidade fetal de 23%1,3. Mas, porque nem todas as mulheres com fetos afetados por deficiência LCHAD ou outros distúrbios da β‐oxidação de ácidos gordos sofrem complicações na gravidez, é provável que fatores não identificados, genéticos ou não genéticos, sejam necessários para desencadear estas complicações6.

As grávidas heterozigóticas são geralmente assintomáticas até que a capacidade do seu fígado para metabolizar os ácidos gordos livres seja excedida, no caso reportado, às 27 semanas, por acumulação de metabolitos produzidos pelo feto homozigótico3.

A história natural do FGAG, ocorrendo predominantemente no terceiro trimestre, é a evolução para uma coagulopatia de consumo, com hemorragias e falência hepática fulminante, se a gravidez não for interrompida. O tratamento, tal como no caso apresentado, consiste em terminar a gravidez, com rápida recuperação após o parto. Em caso de lesão irreversível, poderá ser necessário o transplante hepático1,3.

Um estudo mostrou maior incidência de complicações perinatais em fetos com deficiência LCHAD; no entanto, não clarifica se o aumento de morbidade e mortalidade está relacionado com a deficiência LCHAD em si ou com a gravidade da doença materna1. Depois de um episódio de FGAG, a mulher deve ser informada do risco de recidiva e ter vigilância pré‐natal adequada na gravidez subsequente, clínica e laboratorialmente, com vigilância quinzenal a partir do terceiro trimestre, permitindo, assim, um diagnóstico de recidiva de FGAG em grávidas assintomáticas e sua referência atempada8.

Um casal de portadores deste defeito genético tem um risco de 25% de ter um filho afetado pela doença e a taxa de recorrência de doença hepática materna é de 15 a 25%, devendo ser orientado para uma consulta de aconselhamento genético. O diagnóstico pré‐natal, por biópsia das vilosidades coriónicas ou por amniocentese, permite a identificação do feto com deficiência LCHAD, mas é questionável a legitimidade da interrupção médica da gravidez1,3,4.

No que respeita à criança, a deficiência LCHAD na infância resulta frequentemente, quando não tratada, em morte nos primeiros meses de vida, daí que o diagnóstico precoce seja crucial, como no presente caso clínico3,9–11 .Em Portugal, a deficiência LCHAD é uma das metabolopatias cujo rastreio está incluído no programa nacional de diagnóstico precoce desde 2005. O tratamento consiste em evitar o jejum prolongado, para que o organismo não tenha de recorrer à oxidação dos ácidos gordos para obter energia e também numa dieta adequada com baixo aporte de ácidos gordos de cadeia‐longa e rica em ácidos gordos de cadeia‐média e, eventualmente, suplementos de carnitina3,2.

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

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